Informe n.57 – O sentimento de posse que ceifa a vida da ex-sogra
Neste informe, Néias apresenta o julgamento de Diego Pereira Granada, acusado pelo feminicídio qualificado de sua ex-sogra, Cibele D.A.S., ocorrido em 25 de novembro de 2024. O crime aconteceu durante um conflito entre o réu e sua ex-companheira, Ketelin, com quem manteve uma relação de um ano e cinco meses marcada por agressões e ameaças. Um mês após a separação, Diego foi até a residência de Cibele exigir a devolução do veículo utilizado em seu trabalho. No local, agrediu e ameaçou Ketelin, que chegava de carro acompanhada da irmã e de crianças. Ao ouvir os pedidos de socorro, Cibele tentou impedir a entrada do réu na garagem, momento em que foi atingida por um disparo no peito, resultando em sua morte. Diego tentou fugir, mas foi preso em flagrante e permanece em prisão preventiva até a data do julgamento. Segundo relatos da imprensa, ele também possuía ordem de captura por descumprimento de Medida Protetiva de Urgência em outro relacionamento.
Elaboração do informe: Martha Ramirez-Galvez / Produção gráfica: Mariana Nogueira / Créditos de imagens: Freepik
11/24/20258 min read


1. Apresentação do caso
No dia 25 de novembro de 2025, quase um ano após o crime que ceifou a vida de Cibele D.A.S, será realizado o julgamento pelo Tribunal do Júri de Diego Pereira Granada, acusado do feminicídio qualificado de sua ex-sogra, vias de fato e ameaça contra sua ex-companheira e porte ilegal de arma. O feminicídio de Cibele aconteceu no meio de uma discussão entre o réu e Ketelin, filha de Cibele. Após um ano e cinco meses de convivência, o casal havia se separado fazia um mês, em função das agressões e ameaças de Diego que, na data do feminicídio, exigia a devolução imediata do veículo de trabalho que estava com Ketelin. O réu se deslocou até a casa da ex-sogra, onde deu uma coronhada e ameaçou Ketelin enquanto ela entrava com o carro na garagem, levando como passageiros algumas crianças e sua irmã. Diante da agressão, sua irmã gritou pedindo socorro, sendo acudida por Cibele, que tentou impedir o ingresso de Diego na garagem, recebendo um tiro no peito que provocou sua morte. Diego tentou fugir, mas foi preso em flagrante, sendo decretada e mantida a prisão preventiva até a data do julgamento. Segundo relatos da imprensa, Diego tinha ordem de captura por descumprimento de MPU (Medida Protetiva de Urgência) em outro relacionamento.
#JustiçaPorCibele
#PorNenhumaMenos
2. Dados da vítima e do réu
3. Informações sobre o crime
Data do crime e dia da semana: 30/11/2024 - Sábado
Local: Vista Bela - Londrina
Tipo de ambiente: Residência da vítima
Tipo de agressão: arma de fogo
Tipo de relação: Ex-sogra
Crime ocorreu na presença: do filho de 11 anos, duas filhas adultas e quatro neto
Outras pessoas foram agredidas? Sim, a filha
4. Circunstâncias do crime
Histórico da relação entre vítima e réu
Cibele era ex-sogra do réu. A filha havia se separado um mês antes e estava morando na casa da mãe. No dia dos fatos, Diego se deslocou até a casa de Cibele em moto para reclamar pela devolução do carro, que estava com Ketelin, e que precisava para trabalhar no dia seguinte. Ao Ketelin chegar, depois de fazer compras e recolher o irmão, irmã e sobrinhos, Diego lhe deu uma coronhada e a ameaçou, iniciando uma discussão que levou sua irmã a pedir socorro, acreditando que ele tinha intenção de matar Ketelin. Diante da discussão entre a filha e o ex-genro, Cibele interveio para acalmar Diego, que estava alterado, pedindo-lhe que esperasse descarregar compras do carro para ele levá-lo, mas ele insistiu que Ketelin teria que levar o carro até a residência dele. Cibele tentou impedi-lo de adentrar a garagem, sendo alvejada por um único disparo no peito, vindo a óbito no hospital.
Ketelin teria tentado se separar do réu em outros momentos, mas voltava em função das ameaças que ele fazia contra ela e sua família, de quem manifestava ciúmes. O réu disse que não sabia que tinha uma MPU em vigor e na sentença de pronúncia não é possível esclarecer se tal medida foi expedida em favor de Ketelin e/ou de outra ex-parceira do réu.
Versão das filhas da vítima
Dado que a acusação envolve o feminicídio consumado de Cibele e a agressão contra Ketelin, nesta parte informamos as declarações dela e de sua irmã, extraídas da sentença de pronúncia.
Ketelin conviveu com o réu por um ano e cinco meses, tempo durante o qual ela disse ter sido agredida, o que a levou a tentar se separar algumas vezes, mas voltava com ele por medo das ameaças recebidas. Ele era ciumento, inclusive quando ela tinha contato com seus familiares. Naquele dia, ao ouvir que estava falando pelo celular com sua mãe, que preparava o aniversário do filho de 11 anos, Diego começou a xingá-la e ela foi para a casa da mãe no carro que utilizavam para distribuir leite, sem avisar Diego. Ao chegar na casa de Cibele, Ketelin viu o réu se aproximar, levando uma coronhada e recebendo ameaças de morte. Cibele saiu, tentou acalmar os ânimos, pediu para Diego esperar até tirar as compras e as crianças para ele levar o carro, para ir embora e conversar depois com a filha. Ketelin afirmou que ele estava alterado, com a arma empunhada até disparar contra Cibele na presença de três filhos (ela, a irmã e o irmão de 11 anos), de quatro netos e de outras duas crianças. Ketelin saiu atrás dele, voltando a ser ameaçada enquanto lhe apontava com a arma.
A irmã de Ketelin achou que o réu foi até o local para tirar a vida de sua irmã, o que a fez gritar por socorro. Disse que Ketelin relatava uma vida sofrida. Aparecia com hematomas e marcas de espora provocadas por Diego. Em alguma ocasião acompanhou sua irmã à Delegacia da Mulher, para denunciar a violência que ela sofria, após o que ele teria ameaçado ela e sua família em caso dela se separar.
Cibele também pediu para os vizinhos, que estavam do lado de fora presenciando a briga, que fizessem “algo” e gravaram o que estava acontecendo. Ela foi alvejada com um tiro no peito, vindo a óbito no hospital. Cibele trabalhava como como empregada doméstica e era o arrimo de família. Estava organizando uma festa surpresa para seu filho mais novo, que no dia seguinte fazia 12 anos.
Versão do réu
Durante a audiência de instrução, o réu manifestou que foi um acidente, que estava arrependido, pois não foi até a casa da ex-sogra com intenção de matar. Conheceu Ketelin pouco tempo depois do término de outro relacionamento, disse que ela o ajudou muito e tinham uma relação boa; que ela e sua ex-sogra eram boas pessoas. No entanto, nos últimos seis meses começaram a brigar frequentemente. O casal trabalhava junto, mas o réu afirma que cada vez que Ketelin ia para casa da mãe, o dinheiro sumia. No dia dos fatos, ela foi para a casa da mãe no carro que utilizavam para o trabalho e não voltou, motivo pelo qual ele ligou solicitando a devolução do veículo para atender os compromissos de trabalho. No final do dia, ao observar que Ketelin não devolveria o carro, ele se deslocou em moto para casa de Cibele. Segundo Diego, ao Cibele tentar bloquear a passagem dele para a garagem, teria começado a agredi-lo fisicamente e puxado o coldre que teria ficado enroscado na sua camiseta. Quando Diego sacou o revólver, ele teria disparado acidentalmente, sem a intenção de matar Cibele. A um dos policiais que atendeu a ocorrência, Diego confessou o crime e disse que “foi praticamente uma legítima defesa”.
Nega ter dado uma coronhada em Ketelin e que a teria ameaçado, além de manifestar que não sabia que havia uma MPU em seu desfavor. Em relação ao porte de arma, disse que Cibele sabia que ele andava armado por segurança e para espantar bicho no mato, mas que quando ia para a cidade não carregava revólver, embora naquele dia esqueceu de deixar a arma.
Acusação do Ministério Público
O Ministério Público apresentou denúncia pelos seguintes crimes:
Vias de fato e ameaça contra mulher por razões da condição de sexo feminino contra Ketelin, sua ex-companheira;
Feminicídio de Cibele, praticado em contexto de violência doméstica e familiar, majorado em função de a vítima ser responsável pelo filho de 11 anos, por ser cometido na presença de descendentes (filhas, filho e netos) e por ter dificultado a defesa da vítima;
Porte irregular de arma de fogo.
Alegação ou tese da defesa:
Não entrou no mérito da causa, pleiteando a submissão do réu a julgamento pelo Tribunal do Júri.
5. Cronologia do processo penal
6. Olhar de Néias sobre o caso
O julgamento de Diego Pereira Granada, feminicida de Cibele, acontecerá em 25 de novembro de 2025, data declarada pelas Nações Unidas como o Dia Internacional da Eliminação da Violência contra as Mulheres, que também marca o início dos 16 dias Ativismo contra a Violência de Gênero. A data e o período subsequente têm como objetivo intensificar a luta contra a violência, conscientizando e promovendo ações para erradicar todas as formas de violência contra mulheres e meninas.
O feminicídio é a forma mais extrema de violência contra as mulheres, com impactos devastadores para as/os familiares das vítimas, mas também para a sociedade em geral. Segundo os contra-dados do Monitor de Feminicídios no Brasil (MFB), produzidos pelo LESFEM/UEL, Paraná foi o segundo estado com maior número de feminicídios tentados e consumados em 2023 e 2024, depois de São Paulo. Em 2024 o MFB identificou 144 feminicídios consumados no Paraná, sendo que no mesmo ano Londrina teve seis casos de feminicídio consumado, quatro deles ocorridos em novembro e dezembro. Entre as seis vítimas, quatro tinham ou tiveram relação íntima com o feminicida, mas também foram vítimas fatais uma filha (3 anos) e uma ex-sogra. Em muitos casos, o feminicídio apresenta diversas formas de crueldade, ao procurar não só a letalidade das vítimas, geralmente parceiras ou parceiras, mas também sua desumanização. Mas, a humilhação e a vingança dos feminicidas podem atingir a vida de filhos/as, mães, perdas de entes queridos, sofrimentos provocadas pelo envolvimento em relações violentas, com as quais as mulheres precisam sobreviver.
A Lei nº 14.994/2024, que entrou em vigor no dia 10/10/2024, tornou o feminicídio um crime autônomo, aumentando a pena, incluindo mais agravantes e ampliando medidas punitivas para além do tempo de reclusão, como a perda do exercício do poder familiar, do exercício de cargo público, de visita íntima ou conjugal. O feminicídio de Cibele é o primeiro julgamento da Comarca de Londrina a ser enquadrado nessa lei. Destaca-se, neste caso, a celeridade do judiciário para realizar o Tribunal do Júri que está programado antes de se completar o primeiro ano de feminicídio de Cibele. A associação de celeridade e eficiência na proteção de direitos de todas as pessoas envolvidas no processo, torna-se desejável e necessária para o sistema judiciário dar resposta a familiares vítimas diretas e indiretas de feminicídio, promovendo a percepção de que a justiça será feita.




Expediente
Elaboração do Informe: Martha Ramirez-Galvez
Produção gráfica: Mariana Nogueira
Créditos de imagens: Freepik
Néias - Observatório de Feminicídios Londrina
Londrina, 24 novembro de 2025.
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Para efeitos acadêmicos, citar como:
NÉIAS – OBSERVATÓRIO DE FEMINICÍDIOS DE LONDRINA. Informe n.57. – O sentimento de posse que ceifa a vida da ex-sogra. Ano 04, n. 57. 24 de novembro de 2024. Disponível em: https://observatorioneias.org/informe-n57-o-sentimento-de-posse-que-ceifa-a-vida-da-ex-sogra
Néias
Observatório de Feminicídios de Londrina
Néias Observatório de Feminicídios Londrina (Paraná) é uma organização da sociedade civil que surgiu em 2021, após um grupo de feministas ativistas se organizarem para dar visibilidade e acompanhar o julgamento do feminicídio tentado cometido pelo marido de Néia, Cidneia Aparecida Mariano da Costa, de quem ela estava tentando se separar.
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